sábado, 21 de maio de 2011

Charles e Christine


A varinha de pescar não se mexia; talvez, se fosse de condão, pudesse balançar num lago sem peixes. No barco de madeira, Charles se esforçava para não ter um tremelique de criança e levar uma imerecida bronca própria por pura falta de paciência. Estava petrificado, uma estátua de oito anos, quando a água ondulou no ritmo pausado do seu coração.

A emoção fez sua palpitação acelerar e, coincidentemente, aumentar a ondulação. Não era peixe, não era lixo. Era o vento. Ventou e trouxe consigo outro barco, o de Christine. O encontro das proas manteve o estatismo, olhos nos olhos. Tudo congelado, apenas o chão se movia.

Mantiveram-se parados durante os anos da infância até que a moça, quando debutante, lhe quis como parceiro de valsa. Estendeu a mão, que foi acolhida, resultando no namoro das papilas dérmicas. O toque de pele se prolongou e, juntos, naquela noite, protagonizaram a primeira dança.

Ensaiaram novos passos até o dia em que Charles decidiu surpreendê-la com uma volta de carro pela madrugada. Apossou-se das chaves do Chevrolet dos pais e rodou até a casa de Christine. Estacionou e esperou, apenas o relógio se movia. Na vinda das quatro horas, viu-se forçado a voltar para casa.

Levou duas merecidas broncas dos pais: a primeira por ter tirado o carro da garagem sem permissão; a segunda por ter provocado a depressão de uma garota grávida aos 16, que nem se atrevia a sair mais do quarto.

O remédio seria o casamento. Grinalda na cabeça, aliança no dedo e um bebê no colo, deixaram-se tomar pela lua-de-mel. Viveram assim, a bordo de uma maré de sentimentos, até o anel de compromisso se tornar uma boda dourada. Christine, grisalha, sucumbiu ao naufrágio de si mesma. Charles ficou petrificado até que o sumiço das ondas calasse seu coração.

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